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| Fast x Penarol: um jogo que não será facilmente esquecido. Foto: Tiago Leme |
O jogo entre Fast e Penarol era para ser apenas uma das quatro partidas válidas pela 3ª rodada do returno do Campeonato Amazonense, popularmente conhecido no Amazonas como Barezão - expressão usada pelos amazônidas para se referir a um nativo do estado. Talvez um ingrediente poderia apimentar a partida: o fato de uma derrota do Tricolor (Fast) o eliminá-lo da competição.
Na Zona Sul de Manaus, no campo do Centro Universitário Luterano (Ulbra), chamado pelos barés de "Campo da Ulbra", pela diretoria do Fast de "estádio", cerca de 200 torcedores estavam nas arquibancadas para assistirem a partida. Chamar o palco do duelo de estádio era algo exagerado.
O gramado era bom, a grama baixa permitia que a bola rolasse com facilidade, algo que alegraria jogadores técnicos. Apesar disso, apenas uma das laterais do campo possuía arquibancada - 9 fileiras de concreto - pintadas com as cores do Fast: branco, azul e vermelho. É bem verdade que a cor branca estava sumindo, acho que foi pintada com cal. Na outra lateral, uma paisagem tipicamente amazônica: árvores e mato. A copa das árvores foi o destino final de muitas bolas chutadas pelos zagueiros que estavam em campo. Neste lado do campo estavam os bancos de reservas, os pequenos vestiários e as cabines de imprensa.
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| No Amazonas é assim. Foto: Milanna Ambrósio |
Atrás de um dos gols, uma grade enferrujada evitava com que a bola invadisse outro gramado onde funciona o campo de treinamento do Tricolor. Ao fundo da outra trave, um barranco gramado que servia de base para um dos blocos de salas de aula da Ulbra. Para chegar ao "estádio", o torcedor amazonense passava pela portaria do centro universitário, onde, com o porteiro, adquiria um ingresso pagando R$10. Não existe meia-entrada. Detalhe: a entrada da partida não especificava a partida para qual valia. Era um papel em que constavam apenas o nome dos clubes que disputam o Barezão 2014 e horários de partidas. Sendo assim, penso que posso assistir outros jogos do campeonato. Afinal, não pegaram meu ingresso e nem fizeram algum tipo de marcação. Aliás, acho que se eu falasse ao porteiro que estava indo fazer algo na Ulbra, não teria pago o ingresso.
Dentro de campo, o que me chamava a atenção era a presença de Carlinhos Bala jogando pelo Fast. Com 34 anos, o atacante que se consagrou jogando em clubes do nordeste brasileiro, está correndo nos campos amazonenses. Ao lado dele, o meia Rosembrick, também consagrado no futebol nordestino, e o atacante Pantico, com passagens por clubes como ABC-RN e Bragantino-SP, eram os mais famosos dentro das quatro linhas. Ambos atuando pelo Tricolor Amazonense. Fora das quatro linhas, quem chamava atenção pelo lado do Fast era o treinador do time, Aderbal Lana. Com mais de 60 anos, Aderbal é um dos maiores vencedores do Barézão e além disso, dá um show fora de campo com suas expressões de alegria, raiva e tristeza instruindo os comandados.
Do lado do Penarol - o Leão da Velha Serpa - jogadores desconhecidos. As apostas do clube eram o goleiro Róbson, eleito melhor goleiro do Campeonato Acreano de 2013, e o centro-avante Ramon, artilheiro do clube na competição.
A mobilização da diretoria do Fast para contar com bons jogadores ocorria pelo fato do clube estar a mais de 40 anos sem conquistar um título. No máximo um vice-campeonato, algo que despertava a piada dos torcedores rivais: Fast, o Vasco do Amazonas.
Com a bola rolando, o Penarol estava melhor e abriu o placar com um gol de cabeça do atacante Léo, aos 12' do 1º tempo. Pouco depois, Léo acertou um belo chute na trave. O camisa 7 do time de Itacoatiara, cidade do interior do Amazonas, distante 176km de Manaus, atormentou tanto a zaga adversária que recebeu uma agressão fora do lance por parte do zagueiro do Fast Marcio Abraão. Uma cotovelada no nariz! Cartão amarelo para o defensor, mas a verdade é que ele merecia o vermelho. O jogo esquentou!
O Fast acertou uma bola na trave de Róbson no fim da 1ª etapa em um chute de Pantico e com vitória para o time do interior, a partida foi para o intervalo.
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| Vestiário do campo da Ulbra. Foto: Tiago Leme |
O Fast empatou o jogo novamente. O gol anotado por Carlinhos Bala gerou a maior confusão que já vi em uma partida de futebol. Um escanteio havia sido marcado para o Tricolor. No momento da cobrança, Maikinho, meia do Leão estava caído em campo pedindo atendimento médico (era cera!), o árbitro ignorou, o escanteio foi cobrado e, na confusão dentro da área, Bala empurrou para o gol.
Jogadores do Penarol foram para cima do árbitro, a discussão começou, o bom lateral-direito do Leão, Celsinho, era o mais exaltado. No entanto, o preparador de goleiros do clube invadiu o gramado e agrediu o juiz. Tudo acontecia sem um policial dentro do gramado. O funcionário do Penarol foi contido e a polícia entrou em campo. As coisas estavam se acalmando, porém, o goleiro do time de Itacoatiara se aproximou da confusão para retirar alguns jogadores do bolo, acabou sendo atingido no olho por um jato de spray de pimenta, disparado pelo responsável do policiamento naquela partida. Além de Róbson, o lateral Celsinho do Penarol também sofreu com o spray dos policiais.
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| Como dizem no Amazonas: "a porrada foi segura". Foto: Rede Amazônica |
A confusão só aumentou, os jogadores do Penarol saíram de campo. Nas arquibancadas, torcedores dos dois clubes estavam revoltados. A torcida do Leão disparava ofensas ao árbitro e aos policiais. A do Fast entoava cantos que rebaixavam o time do interior amazonense, como o famoso "timinho! Timinho! Timinho!".
Ao ver Celsinho e Róbson deitados no gramado do campo da Ulbra, sofrendo com o efeito do spray de pimenta, pensei que se durante a Copa do Mundo, Cristiano Ronaldo protestasse contra marcações da arbitragem, a polícia agiria da mesma forma. A situação pode acontecer, afinal, Portugal jogará contra EUA em Manaus, durante o maior evento do futebol mundial.
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| Celsinho e Róbson sofrendo com o spray de pimenta. Foto: Facebook |
O jogo entre Fast e Penarol ficou paralisado por 12 minutos. Após toda a confusão, Celsinho, do Penarol, foi expulso. O goleiro Róbson voltou para o jogo após se recuperar do efeito do spray de pimenta. A partida recomeçou e com um gol de Wilian o Tricolor passou a frente no placar. Jogando com um a menos e levando pouco perigo ao gol adversário, o Penarol parecia presa fácil para o ataque do Fast.
Mas o futebol é uma caixinha de surpresas! O Penarol lutou e aos 58' do segundo tempo conseguiu empatar a partida com um gol do artilheiro do time, Ramon. Ao ver o Fast sofrer o empate, a torcida se calou e observou a festa da minoria azul e branca que estava na outra ponta da arquibancada vibrando com faixas e bandeiras.
O lance do gol penarolense foi o último do jogo. A festa ficou por conta do time de Itacoatiara que comemorou o resultado como uma vitória. Do lado do Fast, silêncio!
Era hora dos torcedores voltarem para casa. Permaneci um pouco mais de tempo na arquibancada e vi uma cena estranha. Enquanto os jogadores do Fast entravam no vestiário, Carlinhos Bala caminhava apressado em direção ao gol que tinha o alambrado enferrujado no fundo. Ele saiu por um portão acompanhado de um médico do clube. Vendo aquilo, corri para acompanhá-lo. O lado fã de futebol me subiu à cabeça e pensei em pedir uma foto. Você, leitor do C11, deve estar pensando: "por que diabos uma foto com o Carlinhos Bala?".
O atacante do Fast, ainda de uniforme - todo sujo -, segurando duas bolsas e umas peças de roupa caminhou para o carro do médico do Fast onde deixou as coisas e partiu para outro veículo. Gentilmente, fui atendido por Carlinhos Bala que me pediu para que o acompanhasse até o automóvel onde ele deixou o campo. Ele estava chateado com o resultado do jogo.
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| Bala deixando o estádio. Foto: Milanna Ambrósio |
"A gente se matando para fazer um gol lá na frente e eles tomam gol com um a menos lá atrás", esbravejou Carlinhos Bala.
Tirei a foto com ele, que pediu desculpas por me ter feito esperar. Enquanto os jogadores do Fast estavam no vestiário, Carlinhos Bala deixou o estádio uniformizado, de chuteiras e sem se quer tomar um banho. Achei o fato muito estranho. Nunca havia visto algo assim ou muito menos ouvido falar de coisas do gênero.
Não imaginava que um simples jogo do Campeonato Amazonense me renderia uma bela história para contar. O policial que disparou o spray de pimenta contra os jogadores do Penarol disse, em entrevista para a Rede Amazônica (afiliada da Globo), que o goleiro Róbson tentou agredir ao árbitro e por isso agiu daquela maneira. Para mim, despreparo puro! Afinal, imagens da reportagem em que a declaração do policial foi reproduzida mostraram que o arqueiro do Penarol estava com os braços para o alto tentando finalizar a confusão.
Em nota oficial, a presidência do Penarol disse ter afastado o preparador de goleiros que agrediu ao árbitro do jogo e que espera que sejam punidos o policial que disparou o spray e a arbitragem da partida - que foi muito mal, diga-se de passagem.
É, amigos, este foi meu dia acompanhando o futebol amazonense!
E antes que eu me esqueça, a pronuncia do nome dos clubes que estavam em campo pode gerar uma confusão. 'Fast' não se refere ao termo em inglês que significa 'veloz', portanto, não se pronuncia 'fést', e sim, 'Fast'. Já do lado de Itacoatiara, embora lembre o clube uruguaio, Penarol não é Peñarol. Sendo assim, se diz 'Penarol' e não 'Penharol'. Aprenda, porque a torcida dos clubes fica brava com esse tipo de erro.
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| Carlinhos Bala estava meio desanimado com o empate. Foto: Milanna Ambrósio |
Em nota oficial, a presidência do Penarol disse ter afastado o preparador de goleiros que agrediu ao árbitro do jogo e que espera que sejam punidos o policial que disparou o spray e a arbitragem da partida - que foi muito mal, diga-se de passagem.
É, amigos, este foi meu dia acompanhando o futebol amazonense!










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